quarta-feira, 30 de abril de 2025

Quando a escuridão fala

 

Enquanto muitos estão pensando em festas de maio, aqui no Hemisfério Sul, uma celebração silenciosa e ancestral ecoa sob a luz suave da lua: o Samhain, o Ano Novo das Bruxas. Celebrado entre 30 de abril e 1º de maio, esse sabá não é apenas uma data no calendário wiccano; é um convite para pausar, respirar fundo e mergulhar dentro de si. É o momento de se conectar com nossos ancestrais, honrar o que passou e preparar o coração para o novo que virá.

Ao contrário da imagem clichê das bruxas voando em vassouras ou mexendo caldeirões borbulhantes, Samhain é uma celebração de silêncio e profundidade. Marca o fim do ciclo da colheita e o início do período mais escuro do ano, quando a natureza repousa, as folhas caem e a terra, silenciosa, se prepara. Dizem que é nessa época que o véu entre o mundo dos vivos e o dos mortos fica mais fino. É quando sentimos, quase como um sussurro, a presença daqueles que vieram antes de nós. É tempo de lembrar, de agradecer, de aprender com as histórias que eles deixaram.

Mas Samhain não é só sobre saudade ou despedidas. É também um convite para o autoconhecimento. Em meio à escuridão, encontramos um espaço para olhar para dentro, para refletir sobre o que precisamos deixar ir e o que queremos carregar conosco. Quais hábitos ou relações já não nos servem mais? Que sonhos precisam ser plantados agora para florescerem quando a luz voltar?

Aqui no Brasil, onde as estações não são tão marcadas quanto em outros lugares, é fácil se desconectar desse ciclo natural. Mas, se pararmos para observar, percebemos que a natureza ao nosso redor também muda. As folhas secam, o clima esfria, e o ritmo da vida diminui. E nós? Quantas vezes nos sentimos fora de compasso, tentando acompanhar um ritmo que não é o nosso? Samhain é o momento de reconectar com o ritmo da natureza e, principalmente, com o nosso próprio ritmo interno.

Na cultura popular, Samhain muitas vezes se mistura com o Halloween, aquele festival de fantasias e doces celebrado em 31 de outubro no Hemisfério Norte. Mas, para nós aqui no Sul, faz mais sentido ajustar essa roda e celebrar o fim do ciclo no nosso outono. Afinal, é agora que a natureza também começa a se recolher, preparando-se para o inverno.

Você não precisa de grandes rituais para sentir a energia dessa data. Pequenos gestos fazem toda a diferença: acender uma vela em homenagem aos seus ancestrais, escrever sobre o que você deseja deixar para trás, meditar sobre as lições que a vida trouxe no último ano ou, simplesmente, silenciar o mundo ao seu redor e ouvir sua própria voz. Samhain é sobre isso: encontrar significado no simples, no cotidiano.

Vivemos em um mundo que nos empurra constantemente para a pressa, para a produtividade desenfreada, para o "próximo". Mas parar para refletir, para honrar o que foi, é um ato de coragem. Samhain nos ensina que o fim não é algo a ser temido; é uma parte essencial da jornada. Porque é no espaço deixado pelo que se foi que o novo encontra lugar para nascer.

Então, enquanto o calendário comum marca mais um dia qualquer, aqueles que celebram o Samhain sabem: às vezes, é preciso abraçar a escuridão para descobrir onde realmente está a luz.